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EGM.
septiembre 2010 /
Publicación semestral. ISSN: 1988-3927. Número 7, septiembre de 2010.

Liberdade (e) Angústia em Sartre

Osvaldino Marra Rodrigues

… la liberté est choix de son être,

mais non pás fondement de son être [*]

I. Phänomenologie: Zu den Sachen selbst

Zu den Sachen selbst, o lema, a máxima da fenomenologia [1]. Lido à distância, parece não comportar uma radicalidade do pensar. E, no entanto, foram palavras que imprimiram, no Continente, uma reorientação no modus operandi filosófico. Retornar às coisas mesmas soava aos ouvidos desavisados, imersos na tradição da unidade do ser e pensamento, um regresso à filosofia pré-kantiana, uma vez que a interdição ao realismo que buscava conhecer a Ding an sich selbst [coisa em si mesma], fora estabelecida, clara e firmemente, na Kritik der reinen Vernunft, na qual o sujeito transcendental, no campo transcendental, seria quem estabeleceria, a priori, os conceitos que regulam os objetos da experiência e a possibilidade do conhecimento. Ali, as Erscheinung [aparições] emergem destituídas de sentido e valor; por esse motivo, somente “na medida em que são pensadas como objeto de acordo com a unidade das categorias, denominam-se Phaenomena [fenômenos]” [2]. Embora um questionamento, como o que fez Heidegger, tenha lugar aqui: “de onde vem e como se determina, segundo o princípio da fenomenologia, aquilo que deve ser experimentado como a ‘coisa ela mesma’ [die Sache selbst]? Será ela a consciência e a sua objetualidade, ou antes o ser do ente no seu não-estar-encoberto e no seu encobrimento?” [3]

Por conseguinte, as Sachen selbst das quais falam os fenomenólogos, para o desgosto dos realistas obstinados, não são coisas da atitude natural, tais como os objetos para os quais aponto o dedo e podem ser expressos numa proposição descritiva, pois o nomear objetos não constitui conhecimento. Aqui não está em jogo a prova da existência do ‘mundo exterior’ e a correspondência entre a representação da realidade e a ‘realidade’ tal qual seria ‘em-si-mesma’. Kant sustentou que “não podemos conhecer nenhum objeto como Ding an sich selbst, coisa em si mesma, mas somente enquanto objeto da intuição sensível, isto é, como fenômeno” [4]. Por este motivo, as coisas mesmas descritas na fenomenologia não podem ser apontadas com o dedo, como o faço com ‘cadeiras’, ou ‘mesas’. Conhecer é conhecer a qualidade de um modo de ser de uma coisa expressa num juízo, como ‘esta cadeira é maior que aquela’. Como sustentou Merleau-Ponty, o “mundo não é um objeto do qual possuo comigo a lei de constituição; ele é o meio natural e o campo de todos os meus pensamentos e de todas as minhas percepções explícitas” [5]. Por esse motivo, o verbo de uma proposição como, esta cadeira ‘é’ maior que aquela(x1 > x2), não pode ser verificado empiricamente, menos ainda a predicação ‘maior que…’. A qualidade de uma proporção não tem correspondência no mundo empírico, não pode ser apontada, embora possa ser expressa enquanto vivência [Erlebnis]. Mais específico: a fenomenologia não visa ao ‘real’, à realidade empírica do imediatamente percebido (seja lá o que essa expressão significa), mas às unidades ideais de significação. É o ‘real’ da atitude natural dos realistas que deve ser posto em suspenso, entre parênteses, a έποχή da redução fenomenológica. Por conseguinte, coisas [Sachen], emergem no e do campo transcendental. Sob a ótica fenomenológica, o “mundo não é aquilo que eu penso, mas aquilo que vivo, sou aberto ao mundo, me comunico indubitavelmente com ele, mas não o possuo” [6]. Por esse motivo, o sentido pela descrição não se dá por conceitos que tendem ao esgotamento da vivência do percebido, reduzindo-a ao campo metafísico da pré-determinação pelo sujeito do conhecimento.

Igualmente desgostosos ficaram os idealistas empedernidos, pois ‘coisas’ não constituem um mundo separado do mundo fático no qual estamos radicados; ‘coisas’ constituem realidade e esta, como afirmou Heidegger, “ist Widerstand”, mais especificamente: “Widerständigkeit” [7]. Afinal, uma vaca da razão não fornece o leite que nos alimenta – embora um idealista possa sustentar que a vaca já estava na ideia desde o princípio, sendo possível demonstrar diacrônicamente o percurso desta ‘verdade’. Enfim, a fenomenologia é “uma filosofia que repõe as essências na existência” e “não pensar que se possa compreender o homem e o mundo de outra forma senão a partir de sua facticidade” [8]. Esta, a facticidade, “o conjunto das resistências”, permanece enquanto obstáculo intransponível para o idealista ingênuo, a “pedra dura” na qual “a minha pá se encurva de volta” [9].

No fim e ao cabo, o Zu den Sachen selbst instaurava a abertura do espaço intersubjetivo, transcendental, no qual se dão as coisas pela descrição e análise enquanto vivência. Enfim, pensar as duas pontas do fio da meada, o Ontológico e o ôntico enquanto ontologische Differenz [10], como uma relação recíproca que se estabelece numa simultaneidade fática. Se na redução fenomenológica há descrição e análise, estas devem ser compreendidas enquanto relação sincrônica das duas pontas do fio da meada, o perquirido e o perquiridor. Portanto, a redução vai ao encontro ao fenomenicamente dado, ao campo transcendental no qual o fenômeno emerge aquém de qualquer especulação metafísica. Como pertinentemente observou Hannah Arendt, a tradição sustentada na hipótese da “unidade do Ser e pensamento pressupunha a coincidência pré-estabelecida entre essência e existência, ou seja, pressupunha que tudo o que é pensável também existe e que todo existente, porque é cognoscível, deve ser também racional” [11], resultando numa tensão permanente entre realistas e idealistas dogmáticos que sempre repunham a pergunta do conhecer na esfera metafísica do conceito, ora enfatizando o objeto, ora a razão. Enfim, a fenomenologia é “uma filosofia transcendental que coloca em suspenso as afirmações da atitude natural para compreendê-las, mas é igualmente uma filosofia para a qual o mundo já está sempre ‘ali’, anterior à reflexão, como uma presença inalienável” [12].

II. Le phénomène de la liberté

No entanto, poder-se-ia perguntar aqui: qual a relação entre a fenomenologia e o tema proposto? A precedência do transcendental em relação ao transcendente e a emergência da liberdade. Foi Kant quem distinguiu os usos da razão entre o (a) teórico, circunscrito à pergunta “Que posso saber?” [13], meramente especulativo, do (b) prático, que concerne à pergunta “Que devo fazer?” [14]. Esta, esclarece Kant, embora pertença à esfera da razão pura, “não é transcendental, mas moral” [15]. No entanto, em que pese a distinção, o problema concernente à determinação da liberdade permanece em aberto. Porém, a crítica feita por Kant liberou o agir humano, a ação, dos determinismos, sejam eles teológicos ou naturais. A verdadeira, se se pode utilizar este adjetivo, ação é livre, isenta dos determinismos do naturalismo ou da teologia. Se tudo o que ocorre na natureza é segundo regras, no âmbito da razão prática ocorre segundo um Faktum der Vernunft [fato da razão] [16], do Unbedingte [incondicionado] [17].

Antes da distinção operada por Kant, a esfera da compreensão sobre a moral estava vinculada ao transcendente, ao objeto em si mesmo que independia do humano, mas com o qual estava vinculado pela adaequatio intellectus et rei pelo conceito. Ademais, o verdadeiro na adequatio pelo conceito pressupunha o próprio Deus. Logo, a relação entre intelecto e coisa estava suportada por um elemento comum de participação, o conceito que, em última instância estava assegurado por Deus, causa sui e fundamento. Por essa via, ao lançar a pergunta, o ente humano percorria uma circularidade que remetia do princípio, Deus, e ao fim, Deus. Por conseguinte, o fático no qual estava radicado o ente que pergunta estava assegurado pela metafísica dogmática, e a relação fundamental entre entes, o homem entre eles, estava garantida pela hipótese do ato de criação divina de um Deus enquanto infinita fonte de existência: “a alma que emana de Deus se derrama ser cessar abundantemente sobre todos os seres” [18]. Nesta esfera metafísica da ontoteologia, o conhecimento e a moral não emergiam como problema, uma vez que a adequação entre o intelecto e o objeto estava garantida pelo Deus criador e, também, salvador. No que tange ao conhecimento, a ratio estava assegurada pela participação no intelecto divino; quanto à moral, bastava simplesmente seguir os preceitos da revelação divina, seja pelas escrituras judaica, cristã ou o Alcorão. Se emergem problemas quanto ao agir, deve-se voltar e seguir piedosamente os preceitos divinos encravados no coração e ofertados na revelação. Sob essa influência, a filosofia não possuía, ipso facto, uma autonomia de pensamento, dado que o próprio pensamento estava já delimitado e assegurado por aquilo que Kant denominou ontoteologia. Em outro prisma, o Ser, o fundamento originário compreendido como Deus, assegurava uma tripla perspectiva: (i) por participação, o intelecto humano; (ii) Deus cria e sustem os entes em sua totalidade e (iii) Deus revela a moral, as normas do agir. Assim, o conceito de Ser era compreendido na esfera da teologia. Nessa esfera de compreensão metafísco-ontoteológica, a facticidade ôntica não passava de um mal entendido, um emaranhado a ser desfeito, dado que no Ser estava implicado e sustentado tudo aquilo que denominamos realidade. Bastaria aplicar a ratio em conformidade com esse horizonte de verdade para que o ente humano pudesse, ens creatum, chegar às conclusões asseveradas pela revelação. Deus, pois, era a gênese, o meio e o fim do périplo da ratio, esta mesma assegurada por participação. Em outro prisma, em conformidade com a metafísca-ontoteológica, o conceito do ens finitum era compreendido de maneira negativa, enquanto ens creatum dependia do ens increatum, Deus. No fim e ao cabo, a metafísica, que é o pensamento da representação, eliminava as diferenças pela unidade do conceito. Em Heidegger de Sein und Zeit, sobretudo, essa filosofia da identidade que reconcilia teoricamente o conceito e a intuição será duramente criticada, bem como por Sartre, para o qual a via do fundamento ontoteológico (e) metafísico estava interditada.

A interdição origina-se pela crítica ao procedimento da filosofia da identidade do finitismo kantiano. Para Kant, filosofias que procuram estabelecer critérios a partir de conceitos e que não possuem nenhuma relação com a possibilidade de conhecimento, são dogmáticas. O procedimento dogmático, afirma Kant, tem a “Anmaßung [petulância] de que é possível progredir tão somente com o saber puro por conceitos apenas (conhecimento filosófico), por princípios há muito usados pela razão, contudo sem se indagar como e com que direito chegou a eles” [19]. Por este motivo, e radicalizando o cogito cartesiano, o fundamento dogmático-teológico que assegurava a verdade dos conceitos foi colocado na berlinda. A ontoteologia [20], incluindo aí as provas ontológicas da existência de Deus, não passam de especulação da razão pura e, por não ter nenhum vínculo com a experiência possível, dogmatismo, transcende os limites da razão. Com isso, Deus não pode ser negado, tampouco confirmado [21], não passando de “ein regulatives Prinzip der Vernunft” [22] ou seja, “não é a afirmação de uma existência em si” [23].

Com a interdição do afirmar ou infirmar uma ‘prova’ da existência de Deus, Kant estabeleceu uma direção para o pensar posterior, a proeminência do finitismo, da facticidade. Donde, se Deus for pensado na dimensão fáctica fica reduzido a coisa, possibilidade de experiência. Todavia, se pensado nessa dimensão, única possível, os atributos divinos da tradição dogmática não constituiriam mais que um demiurgo grego. Se deus fica reduzido à condição demiúrgica, as forças que determinam e mantêm os fatos, as regras que orientam e ordenam a natureza, estariam acima dele, também ele submetidos a elas, e o problema do fundamento permanece. Com isto, a afirmação leibniziana de que “Deus é a unidade primitiva, ou substância simples original” [24], cai por terra. Ou seja, pensar Deus no âmbito do ôntico é pensar qualquer possibilidade de atributos vazios, mera especulação.

Enfim, aquilo que é afirmado com naturalidade pela tradição dogmática, em Kant torna-se um problema, ao ponto de Heidegger levantar a pergunta: “Como o Deus entra na filosofia?” [25] Se o pensar começa com Deus, será teologia, não filosofia [26].

Ainda Heidegger, radicalizando o problema, afirma:

Hoje, quem por meio de uma longa tradição conheceu diretamente tanto a teologia da fé cristã como a da filosofia, prefere calar-se quando adentra no terreno do pensar que concerne a Deus. Pois o caráter onto-teológico da metafísica tornou-se questionável para o pensar, não devido a algum ateísmo, senão à experiência de um pensar ao que se lhe há manifestado na onto-teologia a unidade ainda impensada da essência da metafísica [27].

Filosofia, pois, deve ser o pensar fático, ontologia fundamental da facticidade [28]. Consequentemente, não há nenhuma verdade na qual o homem possa se agarrar, nenhuma desculpa para sua ação: “A verdade não habita o ‘homem interior’; ou antes, não há homem interior, o homem está no mundo e é no mundo que ele se conhece” [29]. Portanto, o acontecer da verdade [Wahrheistsgeschehe] deve ser compreendido como abertura do mundo [Welterschlieflungl]. Se este é o caso, Sartre, em que pesem as críticas a ele dirigidas por Heidegger na Carta sobre o humanismo [30], pensa o Ser na esfera da tradição kantiana e fenomenológica e, quer admita Heidegger ou não, na esfera do pensar fático, da ontologische Differenz, muito similar à afirmação feita por Heidegger: “A ausência de Deus significa tão somente que já não existe um deus que em si reúne, visível e manifestamente, as pessoas e as coisas /die Menschen und die Dinge/ e que, baseado nessa reunião, articule a história do mundo e a estância do homem nela” [31]. É na ausência de um Deus que articula em si a história do mundo e a estância do homem nele que Sartre orienta o seu pensar. Enfim, o ateísmo de Sartre não a tomada de uma posição arbitrária, mas encontra-se corretamente situada no âmbito da exigência do pensar radical iniciado por Kant e sustentado pela hermenêutica da facticidade.

III. L’athéisme cohérent

Em L´existentialisme est un humanisme, uma conferência de circunstância escrita sob demanda para o clube Beigbeder e pronunciada numa segunda-feira do dia 29 de outubro de 1945, Sartre expõe uma antropologia da finitude fáctica, desprovida de qualquer fundamento e teleologia provenientes do âmbito metafísico e ontoteológico, reafirmando as teses de 1943 do L’être et la néant e da posição assumida por Heidegger em 1927 no Sein und Zeit. As teses da conferência em Beigbeder sustentam uma hipótese: o homem, o para-si na terminologia filosófica de Ser e nada, não possui nenhuma determinação a priori, nenhuma essência a partir da qual o modo de ser humano e sua ação podem se efetivar e desenrolar como que por um determinismo ínsito; por esse motivo, também não está condicionado por uma teleologia, uma finalidade nele programada ou herdada – como é o caso do ‘pecado original’, transmitido de geração para geração. Se há algo pelo qual o homem pode ser compreendido é a liberdade, pela absoluta liberdade, o modo de ser do para-si. É nesse quadro nocional, e da herança teórica discutida nas duas primeiras secções deste artigo, que devemos situar o ‘ateísmo’ de Sartre e as conseqüências dali advindas.

Por consequência dos pressupostos teóricos assumidos, o ‘ateísmo’ de Sartre é ontológico, lógico e metodológico e, também, ético – ainda que não tenha escrito uma ética, como Heidegger também não o fez; por esses motivos o ateísmo de Sartre é coerente no interior dos pressupostos por ele assumidos. No entanto, podemos dizer que é coerente num outro sentido: assumir a absoluta liberdade é assumir uma postura de coerência na e da finitude, com possibilidade de desdobramentos éticos poucas vezes pensados com tamanha força. Esta nossa hipótese encontra-se magistralmente exposta na conferência de Beigbeder, na qual Sartre reafirma sua posição em relação aos princípios livremente assumidos. De acordo com o testemunho ali, seu ‘ateísmo’:

[…] declara que se Deus não existe, há ao menos um ser no qual a existência precede a essência, um ser que existe antes de poder ser definido por algum conceito e que esse ser é o homem ou, como diz Heidegger, a realidade humana. O que significa aqui que a existência precede a essência? Isso significa que, primeiramente, existe o homem, ele se deixa encontrar, surge no mundo, e que ele só se define depois. O homem tal como o concebe o existencialista não é definível porque, inicialmente, ele nada é. Ele só será depois, e ele será tal como ele se fizer. Assim, não existe natureza humana, já que não há Deus para concebê-la. O homem é apenas não somente tal como ele se concebe, mas tal como ele se quer, e como ele se concebe após existir, como ele se quer depois dessa vontade de existir, o homem não é nada além daquilo que ele faz de si mesmo [32].

A radicalidade da noção liberdade exposta na conferência de Beigbeder confronta um conceito milenar assentado na tradição ontoteológica, o livre-arbítrio. Livre-arbítrio não é liberdade, mas uma escolha determinada entre o isto ou o aquilo e na qual está implicada um outro sobre o qual um indivíduo pode transferir a responsabilidade de suas ações, pois sempre está em aberto a possibilidade de que o sujeito defina sua escolha a partir de um outro, argumentando que “não agi assim ou assado por medo de penar no fogo do inferno”; “matei um homem porque recebi ordens do meu superior”; “não viajei porque o carro estava com problema”; “não casei-me porque não encontrei o grande amor”; “não escrevi livros maravilhosos porque não tive tempo e ou condições para escrevê-los”, etc. Na ausência de um transcendente, de um outro para o qual o sujeito poderia transferir a responsabilidade no agir, ele próprio tem que assumir a responsabilidade da sua ação em liberdade, uma vez que a liberdade é o modo de ser do para-si e não pode ser possuída como um objeto, está sempre além e aquém da posse e é no agir que ela se manifesta, inclusive no não-agir, pois “devo saber que se não escolho, ainda assim escolho” [33].

Em última instância, a noção de liberdade adotada por Sartre em L´être et le néant, e magistralmente exposta na conferência de 1946, exige uma tomada de decisão, uma resolução do agir, uma metanóia, uma mudança de mentalidade, na esteira da tradição filosófica, na medida em que o para-si deve assumir a liberdade como único fundamento [34] possível dos valores: “minha liberdade é o único fundamento dos valores e que nada, absolutamente nada, não me justifica de adotar tal ou tal escala de valores” [35]. Não há causa, modelo, regra ou máxima que vigem incondicionalmente, que sejam infinitas. Portanto, sendo o para-si mesmo a inesgotável fonte da sua liberdade, recai sobre ele a absoluta responsabilidade pelas suas escolhas. Qualquer possibilidade de desculpas em um transcendente sobre o qual o para-si intencione transferir sua responsabilidade, é má-fé: “Se definimos a situação do homem como uma livre escolha, sem desculpas ou segurança, todo homem que se refugia por trás da desculpa de suas paixões, que inventa um determinismo, é um homem de má-fé” [36]. Assim, pois, o ateísmo propugnado por Sartre exige do para-si a radicalidade da assunção da plena responsabilidade pelas suas ações, pois a “liberté qui est ma liberte demeure total et infinie” [37].

IV. Mauvaise foi et Conscience

Iniciamos esta secção com Marcel Proust. Mais precisamente, com uma passagem contida em La Prisionière, que constitui uma parte do périplo de À la recherche du temps perdu. Ali nos deparamos com um personagem numa conduta interrogativa: “tout se passe dans notre vie comme si nous y entrions avec le faix d’obligations contractées dans une vie antérioure” [38]. Este questionar, essa conduta interrogativa parece ser a de um homem que coloca em suspenso seu cotidiano, ou que este cotidiano de repente se lhe manifesta com uma característica ainda não percebida, resultando num estranhamento de si-mesmo. Parece mais uma fissura pela qual adentra um raio de luz num quarto completamente blindado para o sol que ilumina, radiante, o mundo ‘lá fora’. Princípio de mudanca? Talvez.

Mas, retornemos à frase: “tudo se passa em nossa vida como se nela entrássemos com o fardo de obrigações contraídas em uma vida anterior”. O personagem parece estar a um passo de uma revelação, de uma verdade que se lhe manifesta súbita. Algo nele e dele vacilou. E, de fato, alguma coisa parece lhe ter ocorrido nesse átimo de tempo, um estranhamento em relação às suas condutas: “n’y a aucune raison dans nos conditions de vie sur cette terre pour que nous nous croyions obligés à faire le bien, à être délicats, même à être polis” [39]. Eis uma revelação que lhe brota súbita: “não há nenhuma razão em nossas condições de vida sobre esta terra por que nos creiamos obrigados a fazer o bem, sermos delicados e mesmo polidos”, simplesmente nenhuma razão. Ninguém, absolutamente nenhuma pessoa tem uma razão pela qual creia-se obrigada a fazer o que faz. E, no entanto, continua a fazer o que faz. Por que?! Nosso personagem não sabe responder, apenas balbucia uma opinião oriunda de um sentimento comum, uma doxa:

Todas essas obrigações que não têm sua sanção nesta vida presente parecem pertencer a um mundo diferente, fundado sobre a bondade, o escrúpulo, o sacrifício, um mundo inteiramente diferente deste, e do qual saímos para nascer nesta terra, antes talvez de retornar, reviver sob o império dessas leis desconhecidas às quais havemos obedecido porque portávamos o ensinamento em nós, sem sabermos quem as traçou ali, estas leis das quais todo trabalho profundo de inteligência nos reconcilia e que são invisíveis somente… [40]

Uma boa resposta para apaziguar seu ‘estado de espírito’, embora ele mesmo admita, enfim, que sua resposta é a de um tolo, “pour les sots” [41]. Atribuir o por que de suas ações para um transcendente é agarrar-se numa mentira que o justifique perante os outros e, também, para si mesmo. Ele mesmo toma consciência que é uma resposta “pour les sots”. Parece, pois, que o ‘nosso agir’ refletido não passa de representação. Agimos representando papéis que acabamos por acreditar que constituem o ‘nosso caráter’, o nosso ‘modo de ser’ e que nossas ações procedem dos papéis socialmente desempenhados.

Eis o problema: acabamos por acreditar que ‘nosso modo de ser’ nos papéis desempenhados é o ‘ser essencial’, a ‘nossa essência’, ‘nosso caráter’ [42]. Entretanto, se assim fosse, por que o estranhamento? Uma mesa jamais poria em suspeição sua condição de mesa. Parafraseando o célebre verso do poema Sacred Emily, de Gertrude Stein, poderíamos dizer: “Table is a table is a table is a table”. Aqui, observe, apenas subsiste uma identidade tautológica não reflexa, não tética (A = A). Uma mesa não pergunta sobre si mesma, não tibuieia na sua condição de mesa porque não se sabe mesa, não se intenciona enquanto mesa, é mesa. A identidade reflexa, ao contrário, emerge da apercepção de uma consciência que se percebe como consciência de algo, se apercebe como diferença. Em alemão há uma frase exemplar dessa experiência tética da consciência: Ich bin nicht Sie! Sie sein nicht ich! [43] Esse ato reflexo, no qual A se distingue de B (A ≠ B), ou atitude interrogativa, emerge da consciência tética, a consciência que coloca diante de si mesma a consciência que tem do mundo e que envolve a própria consciência de si: “o homem que eu sou, se o apreendo tal qual é neste momento no mundo, descubro que se mantém frente ao ser em uma atitude interrogativa” [44]. Do contrário, como “poderíamos nós mesmos conceber a forma negativa do julgamento se tudo é plenitude de ser e positividade?” [45]

Por que a consciência emergiu num átimo de tempo no personagem proustiano? A pregunta é pertinente, pois se o personagem fosse o que fosse, ao modo de uma mesa ser uma mesa (A = A), a conduta interrogativa não se manifestaria nele. A conduta interrogativa emerge porque provém da consciência. Que é consciencia? “A consciencia é um ser que, em seu ser, é consciencia do nada de seu ser” [46]. Esta formulação encontra-se no início do capítulo II, La mauvaise foi, de O ser e o nada, e implica uma perspectiva: a consciência, o modo de ser do para-si, não pode ser o que é no sentido de uma identidade tautológica. Quando a consciência inflete sobre si mesma vai se encontrar no mundo, enquanto consciência de:

De um só golpe a consciência está purificada, clara como um grande vento, nada mais há nela, exceto um movimento para fugir de si, escorregar para fora de si; se, por impossível, entrassem ‘numa’ consciência, seriam tomados por um turbilhão e rejeitados para fora, perto da árvore, em plena poeira, porque a consciência não tem ‘interior’; ela não é nada que o exterior de si mesma e é essa fuga absoluta, esse refugo de ser substância que a constitui como uma consciência [47].

É por esse motivo, retomando Sartre, “o homem que eu sou, se o apreendo tal qual é neste momento no mundo, descubro que se mantém frente ao ser em uma atitude interrogativa” [48].

V. Angoisse (et) Liberté

Lançado no mundo, sem nenhuma desculpa na qual se ancorar, o para-si pode experimentar a mais absoluta e primordial experiência, a angústia [Angst/angoisse]. Como não há nenhum Deus, nenhum parti pris que lhe assegura um fundamento, uma natureza a ser realizada, o homem está suspenso no Abgrund [abismo]. Para Heidegger, o “angustiar-se abre, originária e diretamente, o mundo enquanto mundo” [49], nos conduzindo à experiência da mais absoluta facticidade, sem nenhum conceito, nenhuma verdade, nenhum fundamento metafísico, a mais radical experiência do para-si enquanto In-der-Welt-sein, a experiência da aletheia. Por esse motivo, diante de sua absoluta liberdade, angustia-se o homem. Em Sartre, ao contrário das teorias correntes do período [50], a noção ontológica de liberdade não comporta uma autodeterminação em vista de um fundamento, não é uma conquista – seja pessoal ou política. Em Sarte não se busca uma afirmação da liberdade, como o faz Nietzsche, Marx ou Freud. Não há uma ‘liberdade perdida’ a ser encontrada ao modo do paraíso perdido. Liberdade é a condição mesma, o modo-de-ser do para-si, sua constituição ontológica. É exatamente a experiência da liberdade como absoluta, da liberdade enquanto liberdade como o sem-fundo [Abgrund] sobre o qual está o para-si que o conduz à angústia.

Deve-se ressaltar que a experiência da angoisse [angústia] é distinta da experiência da peur [medo] [51]. Tenho peur diante das coisas: enquanto ‘ser-no-mundo’ o para-si experimenta, ele que é coisa-entre-coisas, o medo. Este, afirma Sartre, provêm do exterior, das coisas que me cercam e que podem causar a minha destruição, o meu aniquilamento. O medo se me apresenta a mim como algo a evitar, “il représente un danger de mort” [52]. Quando caminho numa estreita trilha sem parapeito à beira de um precipício, sinto peur. Neste momento, “aparece o medo, que é o apoderar-se de mim-mesmo a partir da situação como transcendente destrutiva em meio aos transcendentes, como objeto que não tem em si a origem de sua futura extinção” [53]. O medo é “appréhension irréfléchie du transcendant” [54] e, por esse motivo, está situado no plano ôntico.

Nao é o caso da experiência da angoisse, “appréhension réflexive du soi” [55]. Uma coisa é um soldado ter peur de um ataque aéreo; outra, muito distinta, é quando ele tenta prever se poderá suportar o ataque. O medo origina-se numa relação com o transcendente, do perigo que provém de fora; a angústia, na imanência do para-si. Uma coisa é o ter medo de cair no precipício; outra, a possibilidade de jogar-me nele. É na e pela liberdade que sou, pela “apreensão reflexiva” de mim, que emerge a angústia. Nesta, o “homem toma consciência de sua liberdade ou, se preferir, a angústia é o modo se ser da liberdade como consciência de ser; é na angústia que a liberdade está em seu ser colocando-se a si mesma em questão” [56]. Na angústia o para-si apreende suas condutas possíveis como absurdas, sem nenhum motivo, nenhuma determinação; todos os motivos pensáveis são “insuffisamment efficaces” [57].

Na angústia, o para-si tem clara consciência que não possui nenhuma determinação positiva, nenhum fundamento extrínseco e, por esse motivo, está condenado a ser livre, um estrangeiro para si mesmo, além e aquém de qualquer forma ou possibilidade de uma identificação necessária. Como afirma Sartre, ao “constituir uma certa conduta como possível e precisamente porque ela é meu possível, me apercebo que nada pode me obrigar a ter certa conduta” [58]. Compreendo que “je ne suis pas celui que je serai” [59]. A angústia que emerge da experiência da liberdade conduz o para-si ao seu nada de ser. Por estes motivos, em Sartre o nada [néant], como também em Heidegger, não é negação enquanto determinação de negação, mas a condição de ser do para-si; deste, o néant brota como condição. O néant aqui deve ser entendido como absoluta indeterminação pela liberdade, porquanto não há motivo ou fundamento algum pelo qual devo agir, pura contingência, uma vez que “a liberdade não possui essência. Ela não está sujeita a qualquer necessidade lógica” [60]. Portanto, “Motivos e móbeis não têm sentido senão juntos no interior de um pro-jetar que é justamente um conjunto de não-existentes. E este conjunto é finalmente eu-mesmo como transcendência, eu mesmo na medida que devo ser eu-mesmo fora de mim” [61].

A experiência radical da liberdade pela e enquanto angústia nos encaminha às palavras de Roquetin: “o mundo das explicações e das razões não é o da existência” [62]. Esta é pura gratuidade, contingência; existir, “c’est être là[63]. Enfim, a angústia que emerge pela e da liberdade do para-si o leva à consciência de que ele, enquanto para-si, é “une interrogation” [64], “é efetivamente perpétuo projeto de fundar-se a si-mesmo enquanto ser e perpétuo fracasso deste projeto” [65].

Abreviaturas

EN – L´être et le néant: essai d´ontologie phénoménologique.

KpV – Kritik der praktischen Vernunft.

KrV – Kritik der reinen Vernunft.

PhP – Phénomenologie de la perception.

PI – Philosophical Investigation.

SuZ – Sein und Zeit.

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Notas

[*] EN, p. 524: “[…] a liberdade é escolha do seu ser, mas não o fundamento do seu ser”.

[1] Cf. SuZ, p. 27.

[2] KrV A 248-249.

[3] Heidegger, 2009, p. 10.

[4] KrV B XXVI.

[5] PhP, p. v.

[6] PhP, p. xii.

[7] SuZ, p. 209: “é resistência”, “o conjunto das resistências”.

[8] PhP, p. i: “une philosophie qui replace les essences das l’existence”; no entanto, não “pense pas qu’on puísse comprendre l’homme et le monde autrement qu’à partir de leur ‘facticité’”.

[9] PI § 217. Embora o contexto do argumento wittgensteiniano seja a justificação, a imagem é deliciosa e aplica-se magistralmente ao argumento nosso.

[10] “diferença ontológica”. O termo é a marca, segundo Gadamer, do pensamento de Heidegger. Cf.: Gadamer, 2002, p. 355.

[11] Arendt, 1993, p. 20.

[12] PhP, p. I: “une philosophie transcendentale qui met em suspens pour les comprendre les affirmations de l’attitude naturelle, mais c’est aussi une philosophie pour laquelle le monde est toujours ‘déjà là’ avant la réflexion, comme une présence inaliénable”.

[13] KrV B 833: “Was kann ich wissen?”.

[14] KrV B 833: “Wass soll ich tun?”.

[15] KrV B 833: “nicht transzendental, sodern moralisch”. Este conceito será reavaliado na KpV. Nesta obra Kant admite, melhor “fica estabelecida doravante a liberdade transcendental” (A 4) como uma faculdade [Vermögen] da razão pura.

[16] KpV A 42.

[17] KpV A 4.

[18] Tufayl, 2005, p. 55.

[19] KrV B XXXV.

[20] Cf., KrV B 659 ss.

[21] Cf., KrV B 659-670.

[22] KrV B 647.

[23] KrV B 647.

[24] Cf., Leibniz, 2004, p. 139.

[25] Heidegger, 1988, p. 122: “Wie kommt der Gott in die Philosophie?”.

[26] Cf., Heidegger, 1988, p. 119.

[27] Heidegger, 1988, p. 121.

[28] Cf., Heidegger, 2002, p. 46.

[29] PhP, p. v.

[30] Cf., Heidegger, 2008, pp. 341-342.

[31] Heidegger, 1980, p. 265: “Die Fehl Gottes bedeutet, daß kein Gott mehr sichtbar und eideutig die Menschen und die Dinge auf sich versammelt und aus solcher Versammlung die Weltgeschichte und den menschlichen Aufenthalt in ihr fügt”.

[32] Sartre, 1999, pp. 29-30:

[…] déclare que si Dieu n’existe pas, il y a au moins un être chez qui l’existence précède l’essence, un être qui existe avant de pouvoir être défini par aucun concept et que cet être c’est l’homme ou, comme dit Heidegger, la réalité-humaine. Qu’est-ce que signifie ici que l’existence précède l’essence? Cela signifie que l’homme existe d’abord, se rencontre, surgit dans le monde, et qu’il se définit après. L’homme, tel que le conçoit l’existentialiste, s’il n’est pas définissable, c’est qu’il n’est d’abord rien. Il ne sera qu’ensuite, et il sera tel qu’il se sera fait. Ainsi, il n’y a pas de nature humaine, puisqu’il n’y a pas de Dieu pour la concevoir. L’homme est non seulement tel qu’il se conçoit, mais tel qu’il se veut, et comme il se conçoit après l’existence, comme il se veut après cet élan vers l’existence, l’homme n’est rien d’autre que ce qu’il se fait.

[33] Sartre, 1996, p. 63: “je dois savoir que si je ne choisis pas, je choisis encore”.

[34] Embora a palavra ‘fundamento’ seja usada aqui, ressaltamos que não tem conotação com o conceito de fundamento metafísico, dado que a liberdade é o modo-de-ser do para-si e é pensada na esfera do finito.

[35] EN, p. 73: “ma liberte est l’unique fondement des valeurs et que rien, absolutement rien, ne me justifie d’adopter telle ou telle échelle de valeurs”.

[36] Sartre, 1996, p. 68: “Si nous avons defini la situation de l’homme comme un choix libre, sans excuses e sans secours, tout homme qui se refugie derrière l’excuse de sés passions, tout homme qui invente um déterminism est um homme de mauvaise foi”.

[37] EN, p. 592: “[a] liberdade que é minha liberdade, permanece total e infinita”.

[38] Proust, 1988, p. 693.

[39] Id., ibid., p. 693.

[40] Id., ibid., p. 693:

Toutes ces obligations qui n’ont pas leur sanction dans la vie présente semblent appartenir à un monde différent, fondé sur la bonté, le scrupule, le sacrifice, un monde entièrement différent de celui-ci, et dont nous sortons pour naître à cette terre, avant peut-être d’y retourner, revivre sous l’empire de ces lois inconnues auxquelles nous avons obéi parce que nous en portions l’enseignement en nous, sans savoir qui les y avait tracées, ces lois dont tout travail profond de l’intelligence nous rapproche et qui sont invisibles seulement…

[41] Id., ibid., p. 693: “para os tolos”.

[42] Algo muito próximo à vocação. Alguém que se crê vocacionado age em função de um transcendente que lhe convoca. Um vocacionado é aquele que age em função de um transcendente que confere sentido ao seu agir. Neste sentido, a fonte, a origem de sua ação repousa num transcendente.

[43] Eu não sou você! Você não sou eu!

[44] EN, p. 38: “cet homme que je suis, si je le saisis tel qu’il est em ce moment dans le monde, je constate qu’il se tient devant l’être dans une attitude interrogative”.

[45] EN, p. 45: “pourrions-nous même concevoir la forme négative du jugement si tout est plénitude d’être et positivité?”.

[46] EN, p. 81.

[47] Sartre, 2003, p. 88:

Du même coup, la conscience s’est purifieé, elle est claire comme un grand vent, il n’y a plus rien en elle, sauf un mouvement pour se fuir, un glissement hors de soi; si, par “dans” une conscience, vous seriez saisi par un turbillon et rejeté au-dehors, près de l’abre, en pleine poussière, car la conscience n’a pas de “dedans”; elle n’est rien que le dehors d’elle-même e c’est cette fuite absolue, ces refus d’être substance qui la constutuent comme une conscience.

[48] EN, p. 38: “cet homme que je suis, si je le saisis tel qu’il est em ce moment dans le monde, je constate qu’il se tient devant l’être dans une attitude interrogative”.

[49] SuZ, p. 187: “Sinchängst erschließt ursprünglich und direkt die Welt als Welt”.

[50] No cenário inteletual francês do período, o marxismo e a psicanálise eram correntes predominantes do pensamento, enquanto o estruturalismo começava a gatinhar em busca de espaço. Paralelo a estas linhas de pensamento, as ‘teorias da existência’, na expressão de Arendt, causaram profundo impacto. O problema maior foi a assimilação desta perspectiva teórica pelo marxismo e psicanálise e, posteriormente, pelo estruturalismo, reduzindo a fenomenologia aos conceitos predominantes, desvirtuando, dessa forma, o sentido da fenomenologia em categorias teóricas estranhas a ela.

[51] Cf., EN, p. 64.

[52] EN, p. 65.

[53] EN, p. 65: “apparaît la peur qui est saisie de moi-même à partir de la situation comme transcendant destructible au milieu des transcendants, comme objet que n’a pas en soi l’origine de sa future disparition”.

[54] EN, p. 64.

[55] EN, p. 64.

[56] EN, p. 64: “homme prend conscience de sa liberté ou, se l’on préfère, l’angoisse est le mode d’être de la liberté comme conscience d’être, c’est l’angoisse que la liberté est dans son être en question pour elle-même”.

[57] EN, p. 66.

[58] EN, p. 66: “constituant une certaine conduite comme possible et précisément parce qu’elle est mon possible, je me rends compte que rien ne peut m’obliger à tenir cette conduitte”.

[59] EN, p. 66: “não sou o que serei”.

[60] EN, p. 482: “la liberte n’as pás d’essence. Elle n’est soumise à aucune necessite logique”.

[61] EN, p. 481: “Motifs et mobiles n’ont de sens qu’à l’intérieu d’une ensemble pro-jeté qui est justement une ensemble de non-existantes. Et cet ensemble, c’est finalment moi-même comme transcendance, c’est moi en tant que j’ai à être moi-même hors de moi”.

[62] Sartre, 1981, p. 153: “le monde des explications et des raisons n’est pás celui de l’existence”.

[63] ibid., p. 155.

[64] EN, p. 668.

[65] EN, p. 668: “est effectivement perpétuel projet de se fonder soi-même en tant qu’être et perpétuel échec de ce projet”.

 

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